A anestesia local é o ato de bloquear reversivelmente a condução nervosa proporcionando a perda das sensações, principalmente álgicas, sem alterar o nível de consciência. Pode ser realizada por via tópica, infiltração ou bloqueio. É indicada para procedimentos simples envolvendo pequenas áreas do corpo ou como coadjuvantes de outras técnicas anestésicas, a fim de melhorar sua qualidade ou para analgesia pós-operatória.

Mecanismo :

Os anestésicos locais agem bloqueando fisicamente os canais de sódio das membranas neuronais, por interações lipofílicas, impedindo o influxo de sódio e a consequente propagação do sinal nervoso.

Os neurônios que têm axônios mais finos são mais facilmente bloqueados. Isso torna possível o ajuste da dose, bloqueando apenas os neurônios sensitivos e poupando os motores e autônomos que têm fibras axonais de maior diâmetro.

O pH do tecido injetado influencia a ação dos anestésicos locais, uma vez que são preparações ácidas com pH variando entre 3,5-5,5. Quando penetram no organismo, sofrem ação do sistema tampão, fazendo com que se propaguem na forma não ionizada até atingirem as fibras nervosas, onde novamente se ionizam e penetram nos canais.

Quando por algum motivo o pH do meio não é favorável a essa desionização, como em tecidos inflamados cujo pH está mais baixo, o anestésico local perde sua potência

Técnica :

A anestesia local pode ser realizada como única técnica anestésica durante algum procedimento mais simples, ou realizada concomitante a outra técnica anestésica (como anestesia geral ou bloqueio de neuroeixo), a fim de proporcionar maior qualidade anestésica e maior analgesia nos períodos intra e pós-operatório.

Quando realizada isoladamente, o paciente deve estar obrigatoriamente em jejum e monitorizado com cardioscópio, oximetria e verificação de pressão arterial. Um acesso venoso confiável também é mandatório. Todo material de ressuscitação com laringoscópio e tubos orotraqueais deve estar ao alcance, assim como uma fonte de oxigênio. O pré-anestésico deve ser feito com doses baixas de ansiolíticos, pois em muitos casos ocorre a necessidade da colaboração do paciente.

Uma sedação leve após o bloqueio também é bem-vinda, a fim de proporcionar mais conforto ao paciente. Normalmente, anestesias locais isoladas são realizadas no ambulatório, e o paciente é liberado algumas horas após o procedimento, portanto, todos os cuidados para uma alta precoce devem ser tomados.

Nos casos de anestesia local conjugada a outras técnicas, esta normalmente é realizada após a técnica principal, ou seja, após o bloqueio de neuroeixo ou após a indução do paciente.

Em casos em que o objetivo maior é a analgesia pós-operatória, o bloqueio local deve ser realizado no período final da cirurgia, antes do despertar do paciente.

Em todos os casos, deve ser realizada com assepsia e antissepsia do local a ser bloqueado.

A solução anestésica deve sempre conter adrenalina quando esta não estiver contraindicada, a fim de evitar acidentes como injeção intravascular inadvertida, principalmente em regiões mais vascularizadas como mucosas e região intercostal. A adrenalina, além de diminuir o sangramento, age aumentando a duração do bloqueio.

Antes de realizar a injeção, deve-se sempre aspirar o êmbolo da seringa a cada 5 mL injetados, e sempre manter interação visual e verbal com o paciente, a fim do evitar uma possível injeção intravascular inadvertida.

A escolha do anestésico depende da preferência do profissional anestesista e da duração do procedimento. Anestésicos como a Lidocaína costumam agir pelo período de até 2 horas, enquanto a Ropivacaína pode durar até 24 horas, dependendo de sua concentração.

Classificação dos Anestésicos Locais :

Os anestésicos locais são divididos em dois grandes grupos, os ésteres e as amidas, ou seja, são constituídos molecularmente por um anel benzeno e uma amina terciária em uma ligação éster ou amida.

Os ésteres são degradados rapidamente pela colinesterase plasmática, enquanto os amidas pelos microssomos hepáticos. A forma a qual são degradados determina a duração e o efeito de cada classe, sendo os ésteres de duração rápida e os amidas de duração mais prolongada. Outra diferença entre eles é a capacidade de gerar reações alérgicas. Os ésteres são mais alérgenos que as amidas.

ÉsteresAmidas
BenzocaínaBupivacaína
TetracaínaRopivacaína
ProcaínaPrilocaína
CocaínaLidocaína

Em relação à latência e duração, temos :

  • Lidocaína:
    • Início de ação: 3-15 minutos;
    • Duração: 60-120 minutos (sem e com vasoconstritor respectivamente);
  • Bupivacaína:
    • Início de ação: 10-20 minutos;
    • Duração: 2-4 horas;
  • Ropivacaína:
    • Início de ação: 15-30 minutos;
    • Duração: até 24 horas, dependendo da concentração.

Cuidados Gerais :

Devemos levar em consideração alguns fatores como local da injeção, dose e presença de vasoconstritor. Quanto mais vascularizado for um tecido, maior o nível plasmático alcançado, por isso injeções em mucosas e região intercostal são mais perigosas. Daí a necessidade de utilização de vasoconstritor concomitante sempre que este não for contraindicado.

O vasoconstritor mais utilizado é a Epinefrina na concentração de 1:200.000, que, além de diminuir a absorção do anestésico, melhora a qualidade do bloqueio.

Em relação à dose, devemos sempre respeitar o limite superior, evitando, assim, uma intoxicação pelo anestésico local.

Dos anestésicos mais utilizados, temos a Lidocaína, que deve ser utilizada na dose de até 7 mg/kg de peso, dependendo da presença ou não de vasoconstritor, e a Bupivacaína e Ropivacaína, utilizadas nas doses de até 3 mg/kg de peso.

Apesar de todas as precauções, uma pequena quantidade do anestésico pode atingir outros órgãos, como cérebro e coração, ocasionando alguns efeitos colaterais, entre eles ansiedade com tremores, convulsão, confusão, reações alérgicas, hipotensão arterial, bradicardia e depressão nervosa. Se uma grande dose atingir a corrente sanguínea, o paciente pode evoluir para convulsão, parada cardíaca e óbito.

Vantagens de uso de vasoconstrictor :

  • Menor toxicidade;
  • Menor absorção;
  • Maior duração.

Indicações :

  • Procedimentos superficiais pequenos;
  • Biópsia;
  • Retirada de tumores cutâneos;
  • Cirurgia plástica;
  • Cirurgias oftalmológicas;
  • Coadjuvante de outras técnicas anestésicas;
  • Analgesia pós-operatória;
  • Tratamento da dor crônica.

Contraindicações :

Contraindicações gerais :

  • Infecção no local da punção;
  • Tecido muito inflamado;
  • Recusa do paciente;
  • Regiões muito extensas;
  • Alergia ao anestésico local;
  • Lesão nervosa preexistente.

Contraindicações em relação ao uso de vasoconstrictores :

  • Relativas:
    • Hipertensão severa;
    • Coronariopatia;
    • Doença cerebral isquêmica;
    • Hipertireoidismo descompensado;

Complicações :

  • Injeção intraneural;
  • Injeção intravascular;
  • Lesão nervosa;
  • Impregnação neurológica;
  • Intoxicação pelo anestésico local;
  • Reações alérgicas;
  • Convulsão;
  • Parada cardíaca.
  • Absolutas: Extremidades do corpo como ponta dos dedos, orelha, nariz e pênis.

Doses :

  • Lidocaína  (10 mg/mL e 20 mg/mL) com ou sem Adrenalina – 1:200.000 na dose de 3-5 mg/kg sem Adrenalina e até 7 mg/kg com Adrenalina;
  • Bupivacaína 0,5%  (5 mg/mL) com ou sem Adrenalina – 1:200.000 na dose de 2,5 mg/kg sem Adrenalina e até 3 mg/kg com Adrenalina;
  • Ropivacaína  (2 mg/mL, 7,5 mg/mL e 10 mg/mL) até 3 mg/kg;
  • Levobupivacaína  (2,5 mg/mL, 5 mg/mL e 7,5 mg/mL) até 3 mg/kg.
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